Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Aqui, no OBSERVANTES, têm lugar privilegiado:

A poesia, os sonhos e a utopia. A critica incisiva às realidades concretas de Portugal e do mundo baseadas na verdade constatada e só nela. "A verdade nunca é injusta; pode magoar, mas não deixa ferida". (Eduardo Girão)

Aqui, no OBSERVANTES, têm lugar privilegiado:

A poesia, os sonhos e a utopia. A critica incisiva às realidades concretas de Portugal e do mundo baseadas na verdade constatada e só nela. "A verdade nunca é injusta; pode magoar, mas não deixa ferida". (Eduardo Girão)

25.07.07

AREIA PARA OS OLHOS - BASTA!


João Chamiço

Bolas, isto é demais. Não há dia em que os atiradores de areia para os olhos façam uma pausa. Não descansam, estão sempre prontos e enérgicos a tentar cegar-nos. Num dia é o Alberto Jardim que se recusa a cumprir as leis da República e atira poeira ao ar para que fiquem mais uma vez disfarçadas as suas ilegalidades.

No outro dia é o "nosso" Primeiro que atira areia às mãos cheias para os nossos olhos com a        thttp://baraodatroia2.blogspot.com/         treta das prestações sociais para famílias numerosas convencido de que não estamos atentos.

No dia a seguir vem o sr. Paulo Portas envolto no seu habitual ciclone que em redemoinho atira para esses ares com tudo o que é poeira.

Desta vez "quer" que o Governo publique os dados referentes à compra dos submarinos, mas nós bem sabemos que as notícias que correm por aí têm a ver com dinheiros de comissões pagas pela fábrica e que não se sabe onde param e não com os dossiers do negócio própriamente ditos. Mas é claro que atirando areia aos olhos dos incautos sempre se vai camuflando atrás da poeira.

Já quando foi o caso da Bombardier, tudo estava resolvido, os trabalhadores tinham emprego garantido etc. etc. Poeira, poeira e mais poeira. Areia, areia e mais areia. Xiça

João Chamiço

21.07.07

MEMÓRIAS DOS CAMPOS DE ONTEM


João Chamiço

Joana mostrava ser uma mulher calejada, habituada desde a infância à dura realidade dos trabalhos no campo e ter muitas vezes contado os tostões na mercearia para que chegassem até ao final do mês.
Foi por ela que ficámos a saber que, foi “(*) barroa” nas vindimas de Almeirim e na ceifa do arroz no Paul de Magos, na Várzea de Samora e nos arrozais do Vale do Sorraia. Não havia recanto na Lezíria que não tivesse sido por ela regado com as gotas abundantes do seu suor e com as lágrimas dos seus olhos nas campanhas do melão e na apanha do tomate no tempo em que as máquinas, outras não eram que apenas as mãos hábeis e treinadas dos homens e das mulheres e até de alguns adolescentes que aproveitavam o período de férias para granjearem alguns “cobres”.
 
(*)(Barroas” Eram assim chamadas no Ribatejo as mulheres que vinham em ranchos, sobretudo das beiras e da região centro para trabalhar nas tarefas sazonais na Lezíria Ribatejana.)
 
Em Almeirim fui barroa
Não tinha nome de gente
P´rós homens era eu boa
P’rás mulheres a concorrente.
 
Nas suas andanças pelos trabalhos do campo não logrou Joana evitar também um ou outro rigoroso Inverno no Alentejo, na gélida tarefa da apanha da azeitona, que homens e mulheres executavam em troca de meia dúzia de escudos por dia e uma açorda.
 As mãos ficavam-lhes tolhidas pelo frio intenso do gelo. As azeitonas eram muitas vezes apanhadas do chão juntamente com a geada que cobria a terra e a folhagem nos dias em que o sol ficava encoberto e sem força para transformar em água o gelo que a noite produzira. Muitas vezes era necessário trepar por escadas de madeira até aos ramos mais altos, onde o vento gélido soprava paulatinamente, sem pressa nenhuma, num soprar brando e contínuo como se estivesse ali com a missão específica de tolher os dedos das mãos e dos pés àqueles que tinham de trabalhar naquelas condições. Outras vezes era a chuva miudinha, “molha parvos”, como se lhe chama ainda hoje, como se fossem parvos e não famintos os que andavam a ela, e que ainda assim pediam a Deus que, não permitisse que ao “manajeiro” “capataz” desse na cabeça de mandar o pessoal para casa sem perfazerem a dura jornada que daria aso ao ganho dos míseros cobres que perfaziam o salário (jorna) do dia.
 
No distrito de Portalegre, em 1956, era de mais ou menos 7$00 (sete escudos) (€0,034) o salário médio de uma mulher no trabalho da azeitona, quer fosse a apanhar do chão ou a ripar em cima de uma escada ou a carregar à cabeça até ao “carro de bois”. Sem direito a mais coisa nenhuma”. Entendemos por “mais coisa nenhuma”, por exemplo; comida ou bebida.
 Ali, no Nordeste alentejano, não consta, pelo menos nesta época não constava, que houvesse o hábito de dar de comer ao pessoal, ao contrário do que acontecia no Baixo Alentejo onde aí sim, era costume fornecer a açorda ou o feijão-frade durante os trabalhos da apanha da azeitona mas também na ceifa do trigo. Muito menos havia o hábito de dar bebida. Vinho entenda-se!.
 
Manuel Envanlista dá grande ênfase a este facto e à dependência da bebida que a maioria dos trabalhadores demonstrava, porque no Ribatejo era quase “proibido” não dar vinho ao pessoal que se trazia a trabalhar, como se pode ler em: “Rudes Histórias da Ribeira de Muge”, um dos livros editados por este ribatejano.
 
Referimo-nos ao “carro de bois” por ser assim que é vulgarmente conhecido, se bem que no Alentejo eram mais as vacas que os bois que os puxavam. Eram elas os “tractores” daquele tempo e com a sua força de trabalho se rasgavam as terras para a sementeira dos trigais e dois milhos. Acarretavam-se as azeitonas, os cereais, a palha, os fenos, a lenha para as lareiras bem como os matos que se arrancavam à terra a braço de homem e que iriam servir de lastro nos currais do gado e se haveriam de transformar no fertilizante mais natural e mais antigo que se conhece, o estrume.
O estrume era feito com o tempo, a paciência necessária e o quase constante espezinhar e dejectar dos animais por meses e meses a fio. Depois do estrume estar devidamente curtido, o carro e as vacas eram de novo mobilizados, e com eles se fazia o transporte até às terras de sementeira onde era espalhado à mão com a ajuda de uma forquilha e o mais uniforme possível.
Todos estes trabalhos se têm de fazer hoje em dia. Que o digam aqueles que fazem do campo a sua vida de trabalho, com a diferença de que, hoje todas estas tarefas, ou quase todas, se executam mecanicamente.
Os animais também eram chamados a participar na descasca dos cereais. Cerca de meia dúzia de vacas eram levadas a “passear-se” em círculo durante horas, massacrando a palha e as espigas para delas se separarem os pequenos grãos.
 Depois, os homens retiravam a palha de cima dos grãos já soltos e juntavam novamente a palha num outro local da eira.
 Imensos bagos de cereal ainda se mantinham teimosamente presos à espiga, pelo que era agora a vez dos homens se atirarem a eles para os malhar milhões de vezes, e à mercê do sol iam fazendo com que poucos ou nenhuns bagos escapassem agarrados às espigas.
 O pó mordia-lhes as gargantas como se tivessem engolido abrolhos, coisa pouca para quem a força do hábito é uma necessidade, nada que um corcho de água muitas vezes já morna não tivesse a capacidade de abrandar. O pior era a comichão que a mistura de suor com a poeira do “pão” provocavam por todo o corpo, e que o cansaço ajudava de certa forma a abrandar evitando que esta se viesse a tornar em coceira crónica ou em sarna.
  
Era o sol que, entre o raiar da aurora e o crepúsculo, regulava a duração da jornada de trabalho diário, mas nalguns casos era o vento e não o sol que decidia o momento certo de acabar o dia.
Era o caso quando se tratava de limpar de poeiras e cascas os cereais que eram atirados ao vento de um lado para o outro da eira com uma pá de madeira tantas vezes quantas as necessárias para que se apurassem apenas os grãos isentos de sujidade. Era bom que se aproveitasse o vento quando este se mostrava generoso, já que muitas vezes ele se ausentava por dias inteiros deixando desesperados os que dependiam da sua preciosa ajuda para cumprir determinadas tarefas. Se em vez de uma eira ali existisse algum oceano, bem que os barcos ficariam muitas vezes em situação delicada mercê dos enigmáticos caprichos da aragem.
João Chamiço